INTRODUÇÃO
Martin Heidegger nasceu em Messkirch, Schwarzwald (Floresta Negra), na Alemanha, em 26 de novembro de 1889. Cresceu num ambiente cercado de religiosidade, pois seu pai era um sacerdote católico, com certas ocupações na comunidade. A partir desta influência, Heidegger mostrou interesse pelas questões religiosas e despertou seu interesse pela filosofia, pelas leituras de Franz Brentano, um filósofo católico do século XIX, e, mais tarde, pelos pensadores gregos, pré-socráticos, principalmente.
Martin Heidegger nasceu em Messkirch, Schwarzwald (Floresta Negra), na Alemanha, em 26 de novembro de 1889. Cresceu num ambiente cercado de religiosidade, pois seu pai era um sacerdote católico, com certas ocupações na comunidade. A partir desta influência, Heidegger mostrou interesse pelas questões religiosas e despertou seu interesse pela filosofia, pelas leituras de Franz Brentano, um filósofo católico do século XIX, e, mais tarde, pelos pensadores gregos, pré-socráticos, principalmente.
Terminando seus estudos básicos, Heidegger entrou para a Ordem dos Jesuítas e, como noviço, estudou a filosofia cristã medieval e a teologia de São Tomás de Aquino, na Universidade de Freiburg. Já tinha em mente a questão do estudo do verbo “ser”, que seria praticamente o objeto de toda sua obra teórica. Além dos pensadores gregos, teve nítida influência do dinamarquês Soren Kieerkegaard e dos alemães Friedrich Nietzsche e Wilhelm Dilthey. Mas seu grande mestre, naquela época, foi Edmond Husserl, o fundador da fenomenologia, que lhe orientou em sua tese doutoral.
Também recebeu orientações de Heinrich Rickert, mentor da Escola de Baden (neo-kantista). Ainda muito jovem, em 1927, Heidegger surpreendeu o mundo filosófico ao lançar aquilo que, talvez, tenha sido sua obra mais significativa: Sein und Zeit.[i] Trata-se de um trabalho de leitura árdua, quase impossível, para alguns, mas que deixou uma marca de extrema relevância nos meios acadêmicos, servindo de referência para grandes nomes da filosofia como Jean-Paul Sartre, mais outros pensadores existencialistas. Nesta época, Heidegger era professor “ordinarius” da Universidade de Marburg. Em 1928, renunciou sua ocupação e voltou à Universidade de Freiburg, na qual assumiu a cadeira de seu antigo mestre, Husserl. O discurso de posse da cátedra “Was ist metaphysic?” (O que é metafísica) trouxe consigo um dos temas mais desenvolvidos por Heidegger, “das nichts” (o nada).
Na década de 30, Heidegger passou por uma revolução, que lhe afastou dos estudos sobre o ser e o tempo, ao mesmo tempo, em que aderiu ao partido nazista. Essa passagem, embora curta, teve nítidas influências por toda sua vida. Devido ao novo status adquirido, Heidegger foi reitor da Universidade de Freiburg, cargo que renunciou logo depois. Em 1944, com a derrota da Alemanha na II Guerra Mundial, Heidegger parou de lecionar. No ano seguinte, foi proibido oficialmente de lecionar e seu passado nazista foi totalmente investigado. Como não foi condenado por nenhuma ação conexa a Adolf Hitler e seus asseclas, manteve seu direito à aposentadoria. De 1951 a 1958, fez várias conferências. Mesmo atarantado pela idade, Heidegger continuava como um dos nomes mais importantes dentro da corrente fenomenológica da filosofia, até seu falecimento, na sua cidade natal, em 1976.
Em sua obra, Heidegger não deixou explicitamente indicados traços de uma ética. Porém, de modo implícito, sugere uma ética da precariedade, numa instância pós-metafísica. É nítida sua reflexão acerca do ser e as mazelas da “razão instrumental” que o aprisionam e “coisificam” sua dimensão, tal qual uma mercadoria. O papel da Angst (angústia) e a noção da finitude do ser definem sua consciência com relação a si mesmo, revelando-lhe sua essência.
Também recebeu orientações de Heinrich Rickert, mentor da Escola de Baden (neo-kantista). Ainda muito jovem, em 1927, Heidegger surpreendeu o mundo filosófico ao lançar aquilo que, talvez, tenha sido sua obra mais significativa: Sein und Zeit.[i] Trata-se de um trabalho de leitura árdua, quase impossível, para alguns, mas que deixou uma marca de extrema relevância nos meios acadêmicos, servindo de referência para grandes nomes da filosofia como Jean-Paul Sartre, mais outros pensadores existencialistas. Nesta época, Heidegger era professor “ordinarius” da Universidade de Marburg. Em 1928, renunciou sua ocupação e voltou à Universidade de Freiburg, na qual assumiu a cadeira de seu antigo mestre, Husserl. O discurso de posse da cátedra “Was ist metaphysic?” (O que é metafísica) trouxe consigo um dos temas mais desenvolvidos por Heidegger, “das nichts” (o nada).
Na década de 30, Heidegger passou por uma revolução, que lhe afastou dos estudos sobre o ser e o tempo, ao mesmo tempo, em que aderiu ao partido nazista. Essa passagem, embora curta, teve nítidas influências por toda sua vida. Devido ao novo status adquirido, Heidegger foi reitor da Universidade de Freiburg, cargo que renunciou logo depois. Em 1944, com a derrota da Alemanha na II Guerra Mundial, Heidegger parou de lecionar. No ano seguinte, foi proibido oficialmente de lecionar e seu passado nazista foi totalmente investigado. Como não foi condenado por nenhuma ação conexa a Adolf Hitler e seus asseclas, manteve seu direito à aposentadoria. De 1951 a 1958, fez várias conferências. Mesmo atarantado pela idade, Heidegger continuava como um dos nomes mais importantes dentro da corrente fenomenológica da filosofia, até seu falecimento, na sua cidade natal, em 1976.
Em sua obra, Heidegger não deixou explicitamente indicados traços de uma ética. Porém, de modo implícito, sugere uma ética da precariedade, numa instância pós-metafísica. É nítida sua reflexão acerca do ser e as mazelas da “razão instrumental” que o aprisionam e “coisificam” sua dimensão, tal qual uma mercadoria. O papel da Angst (angústia) e a noção da finitude do ser definem sua consciência com relação a si mesmo, revelando-lhe sua essência.
I - A DIMENSÃO ÉTICA EM HEIDEGGER
Loparic (2001) entende que Heidegger, em sua “pós-metafisica”, lança as bases de uma “ética originária”, ao propor ultrapassar a metafísica, o que levaria à desconstrução de uma ética com fundamentos ou vínculos com uma teoria da presentidade (Vorhandenheit). “Sendo assim, a ontologia fundamental e as revisões que Heidegger fez da mesma seriam diferentes formulações de uma ética originária.”
As considerações de Loparic sobre Heidegger sugerem que para que o homem contemporâneo ser racional deve buscar algo que não seja, por incrível que pareça, a própria razão, ou seja, uma “dimensão pré-reflexiva da própria vida”[iii]. Para complementar, Loparic cita Nunes:
“Pois a finitude, dessa forma concebida, possibilita, ao mesmo tempo, a ‘destruição’ dos sistemas morais (éticas infinitistas da salvação, do dever, do prazer e da utilidade) – paralelamente à metafísica – e a libertação da ética originária, já escrita desde Ser e o tempo, em que o trabalho desconstrutivo principia, e da qual nos fala a Carta sobre o humanismo”[iv]
A origem do ético, em Heidegger, é a dor originária, que, em vez de ser superada ou escondida das “dores do mundo”, deve ser suportada. E um dos maiores perigos atuais da humanidade é a objetivação do homem pela racionalidade técnica, numa época em que os entes podem ser praticamente controlados, em sua totalidade, por procedimentos controlados racionalmente. Daí, Loparic diz que, para Heidegger, a “animalidade do homem (...) só se tornou bestialidade estarrecedora que conhecemos na modernidade”[v]. Essa condição a priori é o cerne que dá possibilidades de formular “modos fundamentais de pensar e agir, entre eles, os crimes contra a humanidade”[vi] . E prossegue:
“Se é assim, faz sentido dizer que a objetivação radical do humano é a mais perigosa do que este ou aquele crime ou mesmo do que a soma de crimes contra a humanidade possibilitados por ela. Pois, ao suprimir – por redução silenciosa do homem a um produto industrial – a “essência” do ser humano, a objetivação mantém aberta a possibilidade de volta do abominável, mais que isso, ele torna problemático o próprio conceito de crime contra a ‘humanidade’.”[vii]
No entender de Loparic, a ética heideggeriana não se apresenta como uma alternativa, nem um remédio baseado em princípios metafísicos contra os malefícios, por meio de ações. Nem se preocupa com as privações ônticas, sendo, contudo, uma ética que se preocupa com os princípios que se encarregam do cuidar do existir humano. Este questionamento levanta uma dúvida sobre o modo que a dor é tratada, de modo universal e sistemático, tal como se fosse uma dor intramundana, que poderia ser deferida por algum procedimento tanto de razão instrumental ou razão prática. (LOPARIC, 2001, p. 71)
Esta ética do morar, para Loparic (2001), aponta para um espaço que deve-ser-mantido aberto com exclusividade para o existir do homem, no qual escape ou minimize os efeitos da sua objetivação absoluta pela razão. Duarte (2000), por sua vez, mostra que o “solipsismo existencial”, o isolamento do “si-mesmo decidido”, de um ser quanto aos outros, contém uma não exigência de uma fundamentação última da ação ética. A obra contém em si algo que lhe pode uma nova reavaliação pós-metafísica, no sentido de se chegar a uma ética da precariedade, cuja explicação é: [viii]
“Uma ética da precariedade é desprovida de fundamentos últimos ou procedimentos intersubjetivos capazes de assegurar critérios transcendentais infalíveis de validação da qualidade ética da conduta humana, pois se assenta no reconhecimento da finitude constitutiva do homem. A consideração do ‘ser-para-a-morte’ como o ‘modo de ser mais próprio’ do Dasein não implica a irresponsabilidade ética para com os outros, mas tem seu aspecto positivo a liberação da amizade como o modo próprio da relação ética, inspirando em agir cauteloso e resistente a quaisquer sistemas teóricos que definam padrões últimos quanto à moralidade do agir.”[ix]
Então, a ética da precariedade nada mais seria que um efeito colateral oriundo do momento em que o ser se reconhece como finito e consciente de si mesmo, como Dasein. Nesta circunstância, na qual sua “existência” é “lançada” no mundo vindo a “projetar-se”, não possui fundamentos últimos ontológicos. Portanto, inviabiliza qualquer tentativa teórica de se tentar fundamentar, em termos morais ou cognitivos, os seus projetos mundanos. (DUARTE, 2000, p. 74)
Mesmo não sendo irreal ou inexistente, esta ética da precariedade numa poderia ser exteriorizada como uma norma nem levada aos seus fundamentos últimos, pois só é possível – tal como seu potencial ético – pela não incidência de garantias transcendentais, quaisquer que sejam.[x] Este solipsismo existencial, presente em “Ser e o tempo”, não esteriliza a base na qual as relações éticas são possíveis, porque abre “a possibilidade de que o ‘si-mesmo’ e o ‘outro’ sejam, pela primeira vez, encontrados de maneira própria”[xi] .
II – SINTOMA DA DESORIENTAÇÃO
Para Heidegger, a procura por uma ética nada mais seria que a desorientação que o homem teria, na modernidade, porque depositou toda sua confiança na técnica, com suas atividades de massificação, planejamento e organização. Deste modo, o homem não mais saberia agir porque todo seu comportamento foi moldado pelos preceitos e regras da técnica. Ele afirma a necessidade de se pensar no ethos como a morada do homem, algo mais importante que a imposição e o seguimento de regras. (DUARTE, 2000, p. 77-78)
De acordo com Duarte, o caráter ético da analítica se mostraria no momento em que o Dasein (para consigo) deve abrir o outro como outro, que, em suas palavras, remonta a uma conexão que, calcada em isenção justa, liberta o outro em sua liberdade para si mesmo.[xii]
Além, das considerações sobre a interferência da técnica no modo de viver do homem e de suas preocupações em despachar o fundamento último, outro aspecto relevante para Heidegger é a angústia, que, a seguir, Duarte explica:
“A angústia é a angústia diante do ‘ser-no-mundo como tal’ e, nela, o manual intramundano e a coexistência dos outros ‘afundam’ temporariamente na ‘insignificância’ (Unbedentsamkeit), a tal ponto que o mundo das ocupações e preocupações em que o Dasein cotidianamente decai, ao mostrar-se por um instante em seu ‘nada’, deixa de operar como o horizonte da interpretação pública de si, dos entes intramundanos e dos outros. A angústia revela o Dasein como ‘ser-possível’, como ‘ser-livre para a liberdade de escolher-se e apreender-se, trazendo-o para diante da possibilidade que ele já é.”[xiii]
Por meio da angústia, o Dasein toma compreensão da própria morte, revelando o “ser para a morte”, de quem foge quando se ocupa ou se preocupa. Ninguém pode ser substituído no advento da própria morte. O Dasein só existe quando dá a si mesmo esta possibilidade. “A modificação existenciária que arranca o Dasein do si-impessoal e o entrega a si mesmo em sua propriedade dá-se como a ‘recuperação de uma escolha’, pois apenas quando escolhe o escolher ele torna possível o seu próprio poder-ser.”[xiv]
A liberdade de não escolher implica numa abertura para outras possibilidades existenciárias, no entanto, não se trata de um mero alívio, mas uma continuidade em abdicar tudo aquilo que não escolheu, devendo suportar, portanto, a decisão de não ter escolhido outras possibilidades. (DUARTE, 2000, p. 91) A consideração com os outros se dá como Dasein decidido, pois ele se reconhece como em débito com os demais. Em posse desta consciência, escolhida, haverá uma possibilidade existenciária de ser bom.[xv]
CONCLUSÃO
Heidegger não explicitou nem manifestou interesse em elaborar uma ética. Porém, sua obra, ao demonstrar que “o cuidado de si é também o cuidado do outro”[xvi], deixa margem para interpretações de que haveria um conteúdo ético em suas mensagens. Afinal, a consideração por si mesmo e a sua relação com os outros é, em si, uma maneira de encarar o indivíduo como parte de um corpo social, em que deve, antes de tudo, saber como agir junto ao outro. Entretanto, antes de se estabelecer regras ou normas, Heidegger mostra que é necessário conhecer o ser, para que ele seja responsável a aja em si, de uma maneira que não se sinta culpado, ou sobrecarregado, por culpas, faltas ou omissões. Muito pelo contrário, basta que ele tenha noção da sua entrega à própria e inevitável finitude.
BIBLIOGRAFIA
BICCA, Luiz. Ipseidade, angústia e autenticidade. Síntese nova fase, vol. 24, n.º 76. Belo Horizonte (MG), 1997. pp. 11-36.
DUARTE, André. Por uma ética da precariedade: sobre o traço ético de Ser e o Tempo. Natureza humana, vol. 2, n.º 1. 2000. pp. 71-101.
HEIDEGGER, Martin. O ser e o tempo. vol. 1 e 2. 11ª ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2002. Traduzido por Márcia de Sá Cavalcante.
LOPARIC, Zeljko. Ética da finitude, in: Manfredo A. de Oliveira (org.), Correntes fundamentais da ética contemporânea. 1ª ed. Petrópolis (RJ): Editora Vozes, 2000. pp. 65-77.
[i] Em português, o livro foi intitulado “O ser e o tempo”. Neste texto, utilizou-se a 11ª edição, da Editora Vozes.
[ii] LOPARIC, Zeljko. Ética da finitude, in: Correntes fundamentais da ética contemporânea, p. 65.
[iii] Idem, ibidem, p. 69.
[iv] Idem, ibidem, p. 70.
[v] Idem, ibidem, p. 71.
[vi] Idem, ibidem, p. 71.
[vii] Idem, ibidem, p. 71.
[viii] DUARTE, André. Por uma ética da precariedade: sobre o traço ético de Ser e o Tempo, in: Natureza humana, vol. 2, n.º 1, p. 101.
[ix] Idem, ibidem, p. 71.
[x] Idem, ibidem, p. 74
[xi] Idem, ibidem, p. 75.
[xii] Idem, ibidem, p. 86.
[xiii] Idem, ibidem, p. 89.
[xiv] Idem, ibidem.
[xv] Idem, ibidem, pp. 96-97.
[xvi] Idem, ibidem, p. 100.
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