domingo, 5 de julho de 2009

Libertade realmente efetiva para ser cidadão







O que é cidadão? No ordenamento jurídico brasileiro, cidadão é o nacional em pleno gozo dos seus direitos políticos. É, sucintamente, o sujeito com capacidade para votar e ser votado, de escolher seus representantes no Governo e de se submeter ao pleito eleitoral para ser escolhido como um representante do Governo.

Contudo, cabe analisar mais a fundo essa definição e sua relação com o contexto sócio-econômico do Brasil contemporâneo. Basta o sujeito ser titular de direitos políticos para exercer efetivamente sua cidadania? Formalmente falando, sim. Mas efetivamente, não.

Há necessidade de o indivíduo compreender o que se passa em seu redor, para que seja realmente livre em suas escolhas. Não há liberdade se o sujeito não tiver “functionings” e “capabilities”, como diria Amartya Sen. Ou seja, possibilidade efetiva de fazer coisas e as combinações dessas possibilidades efetivas de fazer coisas. E, ainda, o “capability set’, quer dizer, o conjunto possível de todas essas combinações.

Pelo processo educacional, seja formal ou informal, o indivíduo adquire esses funcionamentos e os combina conforme suas necessidades. Não se verifica, contudo, essa noção. A desqualificação generalizada dos brasileiros implica quase que invariavelmente num quadro de mão de obra desqualificada e o que é pior sem possibilidades de se qualificar.

Se o indivíduo, no modo de produção capitalista, vende seu trabalho para subsistir, cada vez mais isso se acirra no cenário de competição internacional, tendo em vista o fenômeno da globalização e da revolução das tecnologias da informação.

A acumulação de renda não se dá somente com enfoque no interior das fronteiras, mas também em escala planetária. Assim, o trabalhador brasileiro compete com o trabalhador chinês. Uma multinacional, por exemplo, preferia muito mais um ambiente com mão de obra barata, abundante e qualificada, não pensando duas vezes em transferir suas plantas industriais. O capital não tem fronteiras e o brasileiro deve estar a par disso.

A qualificação da mão de obra se, de um lado, encarece os investimentos externos diretos, podendo inibir empresas multinacionais, por outro lado pode auxiliar no desenvolvimento científico e tecnológico do País. Não é suficiente o Brasil ser um País exportador para gerar divisas internacionais. Muitos dos produtos exportados são commodities, quer dizer, mercadorias com menor valor agregado devido à menor qualidade da mão de obra empregada na sua elaboração.

No entanto, se houver qualificação da mão de obra, via educação, a história pode ser outra. Dessa forma, as exportações podem ser de produtos de maior valor agregado, ou seja, com maior valor intensivo de trabalho de mão de obra qualificada. Isso por si só geraria um diferencial com os outros países “concorrentes” nas exportações. Ademais, é necessária uma mudança de paradigmas mentais para que isso se concretize.

No Brasil, não raro ouvem-se chacotas contra os doutores e mestres, de maneira generalizada e, até mesmo, ignorante. Ora, na Inglaterra as empresas privadas contratam cerca de 700 doutores por ano, enquanto o Brasil tem até hoje 700 doutores empregados no total da indústria nacional.

Há um dado interessante. Cada um doutor empregado na área de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de uma empresa gera de dez a 15 empregos, entre mestres, bacharéis e tecnólogos. Existe, portanto, uma necessidade de conjugar e orientar a economia nesse sentido, para que mesmo que as políticas educacionais sejam bem sucedidas, essa mão de obra qualificada fique ao marasmo por não encontrar mais lugar onde trabalhar, além das universidades.

Pessoas com capacidade crítica, então, com capacidade de aprenderem a aprender de modo contínuo. Esta é a chave para o futuro. Já que se comprovou que o grau de escolaridade, em geral, está diretamente relacionado ao nível de renda do trabalhador. Como dar um emprego de diretor de empresa para uma pessoa que não consegue ler e entender uma página de jornal? Complicado.

Retomando a discussão anterior, é preciso fazer algumas ressalvas com relação às exportações como diretriz primordial para o desenvolvimento do País. O aumento do Produto Interno Bruto (PIB) – a diferença entre as exportações e as importações, de modo simplificado – não significa necessariamente distribuição de renda. O crescimento econômico deve estar conjugado com justiça social. Como fazer isso? Geralmente, por políticas compensatórias para que aqueles que estão em pior situação na escala social sejam compensados pela oportunidade que os capitalistas tiveram de serem bem sucedidos.




Sugere-se a tributação maior sobre a riqueza, de modo que seja investida diretamente em algo que favorecerá diretamente a camada mais pobre da população: a educação.

A educação não se resume ao Homo oikonomicus. Serve para abrir as fronteiras mentais do indivíduo para sua relação com o mundo. Immanuel Kant, filósofo prussiano, já dizia que os cidadãos deveriam ser bem educados para exercerem função de vigilância sobre seus representantes.

Uma pessoa bem instruída dificilmente será enganada por propostas impossíveis de serem realizadas, ou mesmo por comentários demagógicos de parte da imprensa calhorda, por assim se dizer. Nem sempre o que sai na imprensa é verdade, mesmo que sejam críticas aos políticos. Nos dizeres de Michelangelo Bovero, em “Contra o Governo dos Piores”, a manipulação da opinião pública não serve à democracia, podendo até mesmo perverter instrumentos da democracia direta – plebiscitos e referendos – para institucionalizar irracionalidades ou mesmo regimes totalitários.

A imprensa – ao mesmo tempo instituição de educação não-formal e aparato ideológico – deve tal como os políticos ser alvo de vigilância constante dos cidadãos. Entretanto, há necessidade de os cidadãos terem a crítica necessária para tomarem consciência disso.

Quando se fala em educação, não se pode restringir o assunto às instituições escolares. Há todo um conjunto de instituições que servem para “moldar” o indivíduo, seja para melhor ou para pior.

Uma coisa é certa. O capitalismo não e bonzinho com ninguém. E para entrar na briga é preciso se capacitar, via educação. Alguns podem achar ruim, mas não tem jeito. Caso contrário, o Brasil jamais deixará de ser uma República de Bananas.

Um comentário:

Rafael Reinehr disse...

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