terça-feira, 21 de julho de 2009

CICLOS IMIGRATÓRIOS, GERAÇÕES NIPO-BRASILEIRAS E A SUA INFLUÊNCIA ÉTNICA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO



Este texto foi utilizado para fins de uma palestra na Escola Municipal Getúlio Vargas, em Sorocaba (SP), em evento da Secretaria Municipal da Cultura, a respeito do Centenário da Imigração Japonesa para o Brasil, em abril de 2008.





INTRODUÇÃO




No total, foram três grandes ciclos imigratórios do Japão para o Brasil. Os imigrantes e descendentes também deixaram as suas marcas no Brasil. Os nikkeis, como são chamados os japoneses e descendentes, chegaram até a sexta geração no Brasil (rokussei). Mas para fins deste texto, discorrer-se-á da primeira à quarta geração.




I – CICLOS IMIGRATÓRIOS




Pois bem, retomando. Diante do excedente populacional do Japão, o desemprego e a miséria, decorrentes, entre outros fatores, da industrialização forçada promovida pelo imperador Meiji, uma saída encontrada pelo governo foi a imigração de japoneses para outros países, entre eles, o Brasil.




1.1. 1º Ciclo Imigratório




Pode-se falar em três grandes períodos imigratórios do Japão para o Brasil. O primeiro período foi de 1908 a 1924. Aliás, foi em 18 de junho de 1908 que chegou ao Brasil o navio Kasato-Maru, que trouxe os primeiros imigrantes japoneses para o Brasil. Uma curiosidade é que o Kasato-Maru era um navio hospital da Rússia, que foi capturado pelas forças armadas japonesas e, posteriormente, convertido para outros fins, como o transporte de pessoas e mercadorias.


A maior parte desses imigrantes – que vieram no Kasato Maru – era constituída de pessoas pobres, vindas das províncias de Okinawa, Kagoshima, Fukushima, Kumamoto, Hiroshima, Miyagi, Tokyo, Niigata, Yamaguchi e Ehime.


Ademais, como será falado posteriormente pelo Sr. Umeda, em Sorocaba (SP), está em andamento o projeto Parque Kasato-Maru. Será uma praça com temática japonesa que será implantado na esquina das avenidas Antônio Carlos Cômitre e Washington Luiz. Trata-se de uma parceria entre a Prefeitura de Sorocaba e Ucens, em homenagem ao Centenário da Imigração Japonesa.


Nesse primeiro ciclo imigratório, de 1908 a 1924, aproximadamente 13 mil japoneses vieram ao Brasil. A maior parte vinha para o Estado de São Paulo para trabalhar nas lavouras de café, tanto que o Governo de São Paulo bancava o transporte dos imigrantes. Desses imigrantes, de 30% a 50% eram destinados à Zona Velha do Café, ou seja, na parte central de São Paulo, de norte a sul, e na borda oriental do Planalto Central Paulista.




1.2. 2º Ciclo Imigratório




No segundo ciclo imigratório, de 1924 a 1941, vieram cerca de 158 mil japoneses para o Brasil. Nessa época, não era mais o Governo de São Paulo que bancava o transporte, mas o próprio Governo Japonês. Nos idos de 1930, os japoneses já eram o mais numeroso grupo de imigrantes estrangeiros. De 21% a 35% desses imigrantes foram direcionados para a Zona Velha do Café e para a Alta Paulista.


Mas essa numerosidade foi diminuindo paulatinamente até o advento da segunda guerra mundial. Até parar por completo. Cabe falar um pouco da repressão do Governo Getúlio Vargas aos japoneses e descendentes nesse período sombrio da história. Era proibido, por exemplo, se comunicar em idiomas estrangeiros em todos os sentidos. A comunidade nipo-brasileira foi a mais afetada com isso. Não se podia ler, falar ou se escrever em japonês, sob pena de reprimenda dos órgãos repressivos do Estado Novo de Getúlio Vargas.


Os imigrantes japoneses foram retirados de cidades portuárias e de partes da capital paulista e transferidos para o interior do Estado de São Paulo, por uma questão de “segurança nacional”.


Eles ficavam sem noção alguma do que se passava em seu redor, já que muitos não tinham conhecimento do idioma português. Nem se preocupavam em aprender, pois pretendiam retornar ao Japão. A vida no Brasil era apenas uma aventura para arrecadar dinheiro, conforme seus planos originais.


Dessa forma, ficavam isolados das notícias a respeito da guerra e outros acontecimentos nacionais e internacionais. Esse isolamento, o tratamento racista por parte do Estado e a falta de conhecimento ocasionou uma situação que, se analisada hoje, é engraçada. Alguns desses japoneses não acreditavam na derrota do Japão na 2ª Guerra Mundial. Diziam que isso era propaganda enganosa dos aliados para desmoralizar o espírito japonês. Eram denominados “vitoristas”. Por outro lado, havia aqueles que acreditavam na derrota japonesa na 2ª Guerra Mundial, os “derrotistas”.


Dentre os vitoristas, surgiu uma facção denominada “Shindoo Renmei”, a liga dos súditos do imperador. Um grupo que disseminava boatos sobre a vitória japonesa na 2ª Guerra Mundial e planejava atentados terroristas e assassinatos de derrotistas. O impacto da Shindoo Renmei foi tão forte que a Constituinte de 1946 pretendia barrar definitivamente a imigração japonesa para o Brasil. Isso só não ocorreu por causa de um voto contrário, o voto de minerva do presidente da Constituinte.


Essa história pode ser analisada com maior profundidade nos livros “Corações Sujos”, do jornalista Fernando de Morais, e “O Súdito”, do também jornalista Jorge Okubaro.




1.3. 3º Ciclo Imigratório




O terceiro ciclo imigratório iniciou-se em 1952 e terminou em 1973. Houve a retomada da imigração em massa, com a entrada de 46 mil japoneses no Brasil. Nessa época, os japoneses e descendentes na zona urbana já ultrapassava a da zona rural. De 23% a 29% desses imigrantes se dirigiram para a capital paulista e grande São Paulo, e também para o norte do Paraná e para a Alta Paulista.


Aos poucos, os imigrantes japoneses e seus descendentes foram se integrando à sociedade brasileira. Conforme censo de 2000, segundo o estudo “Trabalhando no Brasil – Características da População de Origem Japonesa”, do IBGE, os japoneses e descendentes são, no total, 1.435.490 pessoas, representando 0,84% da população brasileira.








II – AS GERAÇÕES




A seguir, se traça um breve perfil das quatro principais gerações de nipo-brasileiros retratadas na pesquisa da historiadora Célia Oi citada na Revista Veja de 12 de dezembro de 2007.




2.1. Issei




São chamados isseis os imigrantes que chegaram ao Brasil, principalmente, entre 1908 e 1973. Têm faixa etária entre 35 e 100 anos, constituindo 12% da comunidade nipo-brasileira. Nenhum deles é miscigenado. A maioria deles se dedicou à agricultura, comércio e prestação de serviços.




2.2. Nissei




Os nisseis são os filhos dos imigrantes japoneses. Essa geração, em regra, sofreu na pele a discriminação da II Guerra Mundial e fez seus pais, de certa forma, desistirem de retornarem ao Japão para aqui fincarem raízes. Os nisseis têm entre 15 e 80 anos, sendo que 6% deles são mestiços, quer dizer, têm pelo menos um ascendente não japonês. Geralmente, os nisseis mais velhos são agricultores, comerciantes e prestadores de serviço. Os nisseis mais novos, técnicos e profissionais liberais, nas áreas biológicas e de exatas. São 31% da comunidade nipo-brasileira.



2.3. Sansei




Os netos dos imigrantes são chamados de sansei, a terceira geração. São eles que chegaram em maior número às universidades. Representam 41% da comunidade nipo-brasileira, com faixa etária, geralmente, menor a 50 anos. A maioria é constituída de profissionais liberais em exatas e biológicas, sendo que 42% deles têm pelo menos um ascendente não-japonês.




2.4. Yonsei




A quarta geração, dos bisnetos dos japoneses, são chamados de yonseis. Eles são 13% da comunidade nipo-brasileira. Usualmente, sua faixa etária é menor que 35 anos. É a geração mais miscigenada de todas. Pelo menos 61% deles têm um ascendente que não seja de origem japonesa. Os yonseis são estudantes e profissionais liberais em exatas, biológicas e humanas.




III - MOVIMENTO DEKASSEGUI




Como todos sabem, o Brasil foi assolado por uma inflação galopante por volta de 1980. Os preços em alta a todo momento, a perda do poder aquisitivo dos salários e o fantasma do desemprego eram comuns a todos os brasileiros. No fim dos anos 80, iniciou-se timidamente aquilo que se denominou fenômeno dekassegui. Brasileiros, descendentes de japoneses ou casados com descendentes de japoneses, se dirigiram ao Japão para trabalharem, geralmente, como mão-de-obra barata, para depois retornarem para cá.


Com a mudança da legislação de imigração japonesa em 1990, o fluxo dekassegui foi de certa forma regularizado. Atualmente, segundo estimativas do Ministério da Justiça, há 302 mil brasileiros trabalhando no Japão. De acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), cada dekassegui, ao retornar ao Brasil, poupou cerca de US$ 70 mil. Por ano, os dekasseguis enviam ao Brasil aproximadamente US$ 2,7 bilhões. Essa quantia cresce 15% ao ano.


As maiores concentrações de brasileiros se encontram nas cidades japonesas de Aichi, Shizuoka e Gunma. Os brasileiros são o terceiro grupo de estrangeiros em quantidade no Japão, atrás apenas dos coreanos e dos chineses. Há uma rede de serviços e produtos postos à disposição dos brasileiros no Japão, desde rede bancária, jornais, revistas, produtos alimentícios e até uma afiliada da Rede Globo de Televisão.


Um pequeno parênteses. Parece ironia do destino. Os avôs e antepassados desses brasileiros vieram do Japão para o Brasil também com o espírito dekassegui. Ou seja, trabalhar no Brasil para voltarem ricos para o Japão. Muitos deles acabaram abandonando essa idéia e adotaram o Brasil como pátria. Dos 190 mil japoneses que vieram para o Brasil antes da II Guerra Mundial, apenas 19 mil retornaram para o Japão.





BIBLIOGRAFIA

MAGALHÃES, Naiara. Os isseis. Revista Veja. Ed. 2.038, 12 de dezembro de 2007. URL: HTTP://veja.abril.com.br/121207/p_082.shtml

____. Os nisseis. Revista Veja. Ed. 2.038, 12 de dezembro de 2007. URL: HTTP://veja.abril.com.br/121207/p_086.shtml
____. Os sanseis. Revista Veja. Ed. 2.038, 12 de dezembro de 2007. URL: HTTP://veja.abril.com.br/121207/p_088.shtml
____. Os yonseis. Revista Veja. Ed. 2.038, 12 de dezembro de 2007. URL: HTTP://veja.abril.com.br/121207/p_090.shtml
OKUBARO, Jorge J. O Súdito: banzai, Massateru! São Paulo: Editora Terceiro Nome, 2006.
SAKURAI, Célia. Os Japoneses. São Paulo: Contexto, 2007.

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