Prof. Ms. Roger Moko Yabiku
INTRODUÇÃO
O inquérito policial é um
procedimento investigatório que ocorre devido a ocorrência de uma infração
penal. É composto de uma série de diligências para a obtenção de provas e de
indícios de autoria para a proposição, pelo titular, da ação penal.
A Polícia Civil, ou Polícia Federal,
dependendo do caso, deve buscar as provas iniciais para que o Ministério
Público Estadual ou o Ministério Público Federal, ou o ofendido, em se tratando
de ação penal privada, venha a propor a denúncia ou queixa-crime,
respectivamente.
O destinatário imediato do inquérito
policial é o Ministério Público, se for crime de ação penal pública. Se for de
ação penal privada, o ofendido ou quem tenha qualidade para representá-lo. E o
mediato, o juiz.
É
instaurado o inquérito policial para infrações penais com penas superiores a 2
anos. Nos crimes de menor potencial ofensivo e nas contravenções penais,
segundo o art. 69, da Lei nº 9.099/1995, ocorre a lavratura de termo
circunstanciado de ocorrência.
Contudo, se a infração de menor
potencial ofensivo for revestida de certa complexidade, será instaurado o
inquérito policial, que, quando concluído, será enviado ao Juizado Especial
Criminal.
Nos casos de violência doméstica e
familiar, segundo o art. 41, da Lei Maria da Penha (Lei nº11.340/1996), mesmo
que a pena máxima seja inferior a 2 anos, os delitos são apurados por meio de
inquérito policia.
Nos casos de lesão corporal culposa
de trânsito (art. 303, da Lei nº 9.503/1997), num primeiro momento, é crime de
ação penal pública condicionada. Contudo, conforme o art. 291 desta lei, se o
crime for cometido como agente sob influência de álcool ou qualquer outra
substância semelhante, participar de “racha” ou transite em velocidade superior
à máxima permitida, em via de 50 km/h, será crime de ação penal pública
incondicionada. Assim, ocorre inquérito policial.
Nos crimes contra a ordem tributária
(Lei nº 8.137/1990), não pode haver instauração de inquérito policial, sem,
antes, haver encerrado o processo administrativo tributário no qual se discute
a constituição ou não do crédito tributário. A Súmula Vinculante nº 24, do STF,
dispõe: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no
art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/1990), antes do lançamento definitivo
do tributo.”
Podem existir inquéritos
extrapoliciais. O art. 4º, do Código de Processo Penal, estabelece autoridade
administrativa incumbida de realizar a investigação. Então, há inquérito
administrativo para apurar responsabilidade de servidor público; comissão
parlamentar de inquérito, a cargo do Poder Legislativo; e inquéritos para
pessoas com prerrogativa de função, como prefeitos, cujo inquérito é realizado
pelo Tribunal de Justiça, com diligências da polícia.
‘NOTITIA
CRIMINIS’
O conhecimento da autoridade (policial,
ministerial ou judiciária) de um fato tido como infração penal (crime ou
contravenção penal) é chamado de “notitia criminis”, e não denúncia. Através
dela, a autoridade policial pode iniciar as investigações.
Ensina Válter Kenji Ishida (2012, p.
26-27):
O conhecimento da
“notitia criminis” se dá através da:
a) cognição imediata: através de
atividades rotineiras: jornal; através de corpo de funcionários (investigadores
de polícia em São Paulo); da vítima (por meio de boletim de ocorrência:
b) cognição mediata: não por meio de
atuação rotineira, mas de atuação de terceiro: requerimento da vítima (por
escrito e não via boletim de ocorrência), requisição ou representação;
c) cognição coercitiva: prisão em
flagrante: apresentação do autor do fato.
CARACTERÍSTICAS
DO INQUÉRITO POLICIAL
O inquérito policial deve ser
realizado pela Polícia Judiciária
(Civil ou Federal), cuja presidência é da autoridade policial (Delegado de
Polícia ou Delegado Federal). Nas diligências, é auxiliado pelos demais
funcionários integrantes da carreira policial.
O art. 144, § 1º, da Constituição da
República Federativa do Brasil, dispõe que a Polícia Federal destina-se a
“apurar as infrações penais contra a ordem pública e social ou em detrimento de
bens, serviços ou interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou
empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão
interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo a lei
dispuser”.
Cabe às Polícias Civis, dos Estados
e Distrito Federal, segundo o art. 144, § 2º, da CF, “as funções de polícia
judiciária e de apuração de infrações penais, exceto as militares”.
Os membros do Ministério Público
podem acompanhar as investigações do inquérito (art. 26, IV, Lei nº
8.625/1993). Pode, inclusive, instaurar procedimentos investigatórios na
promotoria.
O inquérito policial sempre será
presidido por um Delegado. Se um promotor de Justiça ou procurador da República
acompanhar o inquérito policial, não é considerado suspeito ou impedido. Súmula
234, do Superior Tribunal de Justiça (STJ): “A participação de membro do
Ministério Público na fase investigativa criminal não acarreta seu impedimento
ou suspeição para o oferecimento da denúncia.”
Nos crimes militares, instaura-se
inquérito policial militar, com responsabilidade a Polícia Militar ou das
forças armadas (a depender do autor da infração). Se o crime for cometido por
membro do Ministério Público ou do Poder Judiciário, a investigação ficará a
critério da chefia da instituição ou do Poder Judiciário.
O inquérito policial é inquisitivo. Não é necessário o
contraditório. Conforme o art. 5º, LV, da CF, o contraditório só vigora a
partir do efetivo início da ação penal. Como consequência o investigado não
precisa ser intimado acerca das atividades desenvolvidas pela polícia para
apreciar as provas produzidas.
A vítima da infração penal também
pode requerer diligências, segundo o art. 14 do Código de Processo Penal. Se a
autoridade policial não a acatar o pedido, a mesma pode requerer a membro do
Poder Judiciário ou do Ministério Público.
O inquérito, por não abranger o
contraditório, não pode ser fonte única de condenação. Deve ser produzida, sempre
prova em juízo, junto com o inquérito, para embasar a condenação, segundo o
art. 155, do Código de Processo Penal.
O inquérito policial, apesar de
inquisitivo, não pode se valer de expedientes ilegais, como tortura, escutas
clandestinas, dentre outras.
O inquérito policial é sigiloso, segundo o art. 20, do Código
de Processo Penal. Ele é necessário para a elucidação do fato ou pelo interesse
da sociedade. Entretanto, conforme o art. 7º, XIV, da Lei nº 8.904/1994
(Estatuto da OAB), os advogados podem “examinar em qualquer repartição
policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em
andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar
apontamentos”.
Dispõe a Súmula Vinculante nº 14, do
STF: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos
elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório
realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao
exercício do direito de defesa”.
Os advogados têm direito de acesso
às provas já anexadas aos autos do inquérito. Mas isso não se estende com
relação às provas em produção. O advogado pode acompanhar o interrogatório do
indiciado e na oitiva das testemunhas. Porém, não pode fazer reperguntas, pois o
mesmo é inquisitivo.
O inquérito policial deve ser
necessariamente escrito. Todos os seus atos devem ser reduzidos a termo,
preceitua ao art. 9º, do Código de Processo Penal.
Não é necessário o inquérito
policial para a instauração da ação penal. Portanto, é dispensável. Trata-se de procedimento administrativo. Pode haver
denúncia ou queixa-crime com base em peças de informação, ou seja, quaisquer
documentos que comprovem indícios suficientes de autoria e de materialidade de
infração penal.
Se o membro do Ministério Público
entender que não há elementos para oferecer a denúncia, pode requerer arquivar o
inquérito policial ou as peças de informação. Se, em posse de peças de
informação, o membro do Ministério Público considerar que estas são
insuficientes, pode requerer a instauração de inquérito policial para que haja
diligências para a produção de provas.
Nos crimes de ação penal pública
condicionada à representação, o membro do Ministério Público pode dispensar a
instauração de inquérito policial, se, com a condição de procedibilidade forem
apresentadas provas suficientes para iniciar a persecução judicial.
De acordo com o art. 40, do Código
de Processo Penal, se os membros do Poder Judiciário verificarem, no desempenho
das suas funções, a ocorrência de crime de ação penal pública, devem encaminhar
cópias e documentos ao Ministério Público que, ao recebê-los, pode oferecer
denúncia ou requisitar instauração de inquérito policial.
Sempre que conhecer de infração
penal, a autoridade policial é obrigada a instaurar o inquérito policial (art.
6º, CPP), se for crime de ação penal pública incondicionada e houver
entendimento de que há elementos da materialidade do crime.
Leia mais:
CURY, Rogério; CURY,
Daniela. Processo Penal. Rio de
Janeiro: Forense, 2018.
ISHIDA, Válter Kenji. Prática Jurídica Penal. 6. ed. São
Paulo: Atlas, 2012.
REIS, Alexandre Cebrian
Araújo; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito
Processual Penal Esquematizado. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
Obs.: Texto adequado à alteração do Pacote Anticrime.
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