domingo, 17 de março de 2019

COMENTÁRIOS À LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO (LINDB)




Prof. Ms. Roger Moko Yabiku


INTRODUÇÃO

            A Lei nº 12.376, de 30 de dezembro de 2010, é conhecida como Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Antigamente, era conhecida como Lei de Introdução ao Código Civil (LICC, Decreto-Lei nº 4.567, de 4 de setembro de 1942).
            É uma lei anexa, mas autônoma ao Código Civil. Tem caráter universal, aplicando-se a todos os ramos do Direito Brasileiro. É um repositório de normas preliminares a todo o ordenamento jurídico nacional. “A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro é um conjunto de normas sobre normas, visto que disciplina as próprias normas jurídicas, determinando o seu modo de aplicação e entendimento, no tempo e no espaço”, explica Carlos Roberto Gonçalves (2019, p. 46).
            O dispositivo do art. 4º que manda aplicar a analogia, os costumes e os princípios gerais do Direito em casos omissos, aplica-se em todo o direito, exceto no Direito Penal e no Direito Tributário, que possuem princípios e regramentos próprios.
            No Direito Penal, só se admite analogia “in bonan partem”. O Código Tributário Nacional (CTN) só admite analogia como critério de hermenêutica (interpretação), mas não tem o poder de criar ou majorar tributos.
            O artigo 3ª da LINDB aponta que ninguém pode se escusar de cumprir a lei, alegando não conhecê-la. Isso se aplica a todo ordenamento. Contém princípios de Direito Público e de Direito Privado no tempo e no espaço (art. 1º a 6º), normas de Direito Internacional Privado (arts. 7º a 19) e de segurança jurídica (arts. 20 a 30).




FONTES DO DIREITO

            Fontes do Direito pode significar o poder de criar normas jurídicas ou a forma de expressão das mesmas (cognição). “Nesse sentido, pode-se dizer que a Lei é o objeto da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e a principal fonte do Direito”, explica Gonçalves (2019, p. 48). Fonte é o meio técnico da realização do direito objetivo.
            Fontes históricas são as pesquisadas pelos doutrinadores, no passado, para analisar o sentido e a origem de algum instituto jurídico. Fontes atuais são as que os indivíduos utilizam como base, sendo estas utilizadas para pleitear o seu direito e para o juiz fundamentar a sentença.
            O costume é a primeira fonte do Direito. É a observância constante de determinadas regras no tempo, com a convicção de obrigatoriedade. É o direito não escrito, típico de sistemas de “Common Law”. Contudo, com a evolução social e a organização do Estado, a lei passa a ser a principal fonte do Direito, sendo produzida pelo Estado e imposta coativamente. “Surge o Direito escrito, em contraposição ao anteriormente mencionado, adotado em quase todos os países do Ocidente”, narra Gonçalves (2019, p. 48).
            De acordo com o art. 4º, da LINDB, são fontes formais do direito: a lei, a analogia, o costume e os princípios gerais do Direito. As fontes informais seriam a doutrina e a jurisprudência.
            Alguns autores não consideram a jurisprudência como fonte formal do Direito, sendo apenas indicativo intelectual ou informativo. Contudo, no mundo da prática, a jurisprudência revela-se como fonte criadora do Direito, principalmente, com a instituição da Súmula Vinculante, a cargo do Supremo Tribunal Federal (STF).
            As fontes formais dividem-se em principais (a lei) e acessórias (demais). As fontes diretas (ou imediatas) são a lei e os costumes. As fontes indiretas (ou mediatas) são a doutrina e a jurisprudência.



BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI

            A lei, num sentido amplo, é critério de certeza e de objetividade. Não é revestida da subjetividade dos costumes ou da moral. “A lei, a sentença, o costume e o contrato constituem formas de expressão jurídica resultantes do processo legislativo, da atividade jurisdicional, da prática consuetudinária e do poder negocial”, narra Gonçalves (2019, p. 49).
            O processo legislativo está referido no art. 59 da Constituição da República Federativa do Brasil, e nos regimentos internos das casas legislativas, dentre outra legislação. Para entrar em vigor, deve ser promulgada e publicada, geralmente, em Diário Oficial.
            A lei deve ser revestida de generalidade (dirige-se a todos), imperatividade (impõe um dever), autorizamento (autoriza e legitima o uso da faculdade de coagir, por exemplo, pedir a coação para a reparação do mal sofrido), permanência (não se esgota numa só aplicação, perdura até ser revogada por outra lei) e emanação de autoridade competente (segundo as competências dispostas na CF).
            A União, Estados, Municípios e Distritos Federal, cada qual, possui sua capacidade legiferante. Contudo, cada qual em sua espera de competência. Cada pessoa política têm competência para legislar sobre determinados assuntos. Legislar sobre Direito Civil, por exemplo, é de competência da União.


VIGÊNCIA DAS LEIS

            As leis possuem um ciclo vital, de acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2019, p. 57), “nascem, aplicam-se e permanecem em vigor até serem revogadas”. Marcam-se o início da vigência, a sua continuidade e a sua cessação.
            Uma lei para ser criada passa por três fases: elaboração, promulgação e publicação. Com a promulgação, ela nasce. Com a publicação no Diário Oficial, entra em vigor, iniciando a vigência, tornando-se obrigatória.
            A vigência se inicia com a publicação e se estende até o término do seu prazo de validade ou com a sua revogação. Assim dispõe o art. 2º, da LINDB: “Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.”
De acordo com o art. 1º, da LIND, a lei, salvo disposição contrária, “começa a vigorar em todo o País 45 (quarenta e cinco) dias depois de oficialmente publicada”, fala Gonçalves (2019, p. 57).
            A lei pode entrar em vigor na data da sua publicação, se assim dispuser, ou em outra, mais remota, se assim o dispuser. O intervalo entre a data da publicação e a da sua entrada em vigor é conhecido como “vacatio legis”.
            Se durante a “vacatio legis”, houver nova publicação de seu texto para eventuais correções, o prazo da vigência será contado a partir da nova publicação (art. 1º, § 3º, LINDB). E isso só vale para a parte corrigida, ou emendada.
            Caso a lei já esteja em vigor, as correções serão consideradas lei nova, com obrigatoriedade condicionada ao fim da “vacatio legis” (art. 1º, § 4º, LINDB). Quando admitida a aplicação da lei brasileira em países estrangeiros, ela só se torna obrigatória depois de três meses de oficialmente publicada.

REVOGAÇÃO DA LEI

            De acordo com o art. 2º, da LINDB, “a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue”. Geralmente, a  lei é feita para vigorar em caráter permanente, até ser revogada por outra lei. É o princípio da continuidade. Costume não tem força para revogar lei. E também não perde eficácia pelo seu não uso.
            Em algumas situações, a lei pode ter vigência temporária. Pode findar por causa de:
a-) ocorrência de termo fixado para sua duração.
b-) implemento de condição resolutiva.
c-) consecução dos seus fins.
            Com isso, ocorre a caducidade da lei. Torna-se sem efeito, sem necessidade de uma norma revogadora.
            Leis de vigência permanente perduram até ocorrer a sua revogação. Não podem “ser extintas por costume, jurisprudência, regulamento, decreto, portaria e simples avisos”, ensina Gonçalves (2019, p. 62).
            “Revogação é a supressão da força obrigatória da lei, retirando-lhe a eficácia – o que só pode ser feito por outra lei, da mesma hierarquia ou de hierarquia superior.” (GONÇALVES, 2019, p. 62)
            A revogação pode ser total ou parcial, quanto à extensão. A revogação total também é chamada de “ag-rogação”. Suprime totalmente a norma anterior. Por sua vez, a revogação parcial é conhecida como “derrogação”. Atinge somente uma parte da norma, sendo que o restante permanece em vigor.
            A perda de eficácia pode decorrer, além do seu próprio termo, da decretação da sua inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal. Mas o Senado Federal deve lhe suspender a execução, segundo o artigo 52, X, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
            O princípio da hierarquia não tolera que uma lei inferior sobreviva à uma norma superior que a contrarie. Com a Constituição de 1988, muitas normas não foram recepcionadas. “Não se trata propriamente de revogação das leis anteriores e contrárias à Constituição: apenas deixaram de existir no plano do ordenamento jurídico estatal, por haverem perdido seu fundamento de validade”, diz Gonçalves (2019, p. 63).
            Por sua vez, as normas constitucionais de conteúdo programático, que necessitam de leis complementares ou ordinárias, para lhe dar eficácia, não revogam disposições anteriores, “que continuam vigentes até a aprovação dos novos textos legislativos que concretizem as determinações constitucionais”, analisa Gonçalves (2019, p. 63).
            Com relação às normas que precisam de regulamento para se tornarem obrigatórias, entende-se que o prazo de vigência conta-se a partir da publicação do regulamento, observados os períodos de “vacatio legis”. “Se apenas uma parte ada lei depender de regulamentação, só a ela é aplicável a restrição”, arremata Gonçalves (2019, p. 63).
            Por mandado de injunção pode-se suprir a falta de regulamentação, junto ao judiciário, segundo o art. 5º, LXXI, da CF, no caso de haver pessoas que se considerem prejudicadas pela omissão legislativa e a impossibilidade de exercer os direitos constitucionalmente previstos.
            Também pode ser a revogação expressa ou tácita, quanto à forma de execução. A lei nova declara taxativa e inequivocamente que lei anterior, ou parte dela, foi revogada (primeira parte do art. 2º, § 1º, da LINDB). Trata-se da revogação expressa. “Tácita, quando não contém declaração nesse sentido, mais mostra-se incompatível com a lei antiga ou regula inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior (art. 2º, § 1º, última parte). A revogação, nesse caso, ocorre por via oblíqua ou indireta”, narra Gonçalves (2019, p. 64).
            O parágrafo anterior trata do critério cronológico.
            Agora, passa-se a analisar o critério da especialidade (“lex specialis derrogat legi generali”), conforme preceitua o art. 2º, § 2º, da LINDB: “A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.”
            Podem coexistir normas de caráter geral e normas de caráter específico. Em caso de incompatibilidade entre ambas, há de se verificar, no caso concreto, se é a situação de se preferir a norma geral em vez da especial, ou a norma especial em vez da geral. “Não se pode, portanto, acolher de modo absoluto a fórmula ‘lei especial revoga a geral’, pois nem sempre isso acontece, podendo perfeitamente ocorrer que a especial introduza uma exceção ao princípio geral, que deve coexistir ao lado deste. Havendo incompatibilidade haverá revogação tanto da lei geral pela especial como da lei especial pela geral”, analisa Gonçalves (2019, p. 66).
            Chama-se antinomia quando há duas normas conflitantes. Para resolver isso, há três critérios: a-) cronológico; b-) especialidade; c-) hierárquico. Quando o conflito envolve apenas um dos critérios, trata-se de antinomia de primeiro grau. Se envolver dois desses critérios, é uma antinomia de segundo grau.
            Divide-se a antinomia, também, em aparente e real. Por antinomia aparente, a resolução é com base nos critérios acima explicitados. Contudo, antinomia real não pode ser resolvida por esses critérios. “Ocorre, por exemplo, entre uma norma superior-geral e outra norma inferior-especial. Não sendo possível remover o conflito ante a dificuldade de se apurar qual a norma predominante, a antinomia será solucionada por meio dos mecanismos destinados a suprir as lacunas da lei (LINDB, arts. 4º e 5º”, assinala Gonçalves (2019, p. 66).
            Não se admite repristinação no Direito Brasileiro. Basicamente, seria a restauração de lei revogada pelo fato de lei revogadora ter perdido sua vigência, explica Carlos Roberto Gonçalves (2019). O art. 2º, § 3º, da LINDB, diz que “salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência”.

Leia mais:
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro 1. Parte Geral. 17. ed. São Paulo: Saraivajur, 2019.






                                 

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