Prof. Ms. Roger Moko Yabiku[1]
1. 1. Lei Penal no Tempo
Refere-se a quando a Lei Penal entra em vigor. Em regra, aplica-se lei penal vigente aos fatos ocorridos na sua vigência (tempus regit actum). No entanto, podem existir conflitos de leis no tempo, objeto de estudo do Direito Intertemporal.
1.1. Abolitio criminis
A Lei Penal nova deixa de considerar crime determinada conduta (artigo 2º, CP), fazendo desaparecer os efeitos penais, sejam principais e acessórios, porém não os civis. Assim, declara-se inexistente a condenação, retira-se o nome do condenado do rol dos culpados, em virtude da retroatividade da Lei Penal.
Segundo o artigo 107, III, do Código Penal, tem natureza jurídica de causa extintiva de punibilidade. Fundamenta-se no fato de o Estado não ter mais interesse em punir o sujeito, visto que a sociedade não considera a conduta ofensiva aos seus valores.
1.2. Novatio legis in mellius
A previsão legal está no artigo 2º, parágrafo único do Código Penal. A Lei Penal nova, embora não retire o caráter criminoso da conduta, favorece de qualquer forma o acusado, retroagindo a seu favor. Tem natureza jurídica de norma aplicativa.
1.3. Diferença entre abolitio criminis e novatio legis in mellius
A abolitio criminis tem como efeito tornar o fato atípico, ab-rogando a lei penal anterior. Já a novatio legis in mellius modifica a lei penal anterior, mantendo a incriminação da conduta, porém beneficiando de qualquer outra maneira o acusado.
1.4. Novatio legis incriminadora e novatio legis in pejus
Na novatio legis incriminadora, Lei Penal nova considera crime determinada conduta, porém, em seus efeitos, será irretroativa, pois é mais prejudicial ao infrator. Já a novatio legis in pejus não incrimina a conduta, porém, agrava a situação do acusado, portanto, seu efeito será irretroativo.
1.5 . Lei penal no tempo e norma penal em branco
Se a normal penal em branco for homogênea, obrigatoriamente incide a retroatividade da Lei Penal mais benéfica. Porém, no caso da norma penal em branco heterogênea, se o seu complemento for editado em caráter de excepcionalidade, não há retroatividade da lei mais benéfica. Entretanto, se o complemento da norma penal em branco heterogênea não for execepcional – ou seja, editado em situação de normalidade – retroage a Lei Penal mais benéfica.
1.6 . Leis ultra-ativas
As leis intermitentes – temporárias e excepcionais – estão previstas no artigo 3º do Código Penal. A lei temporária vigora dentro de período previamente fixado pelo legislador, depois disso é revogada. Já a lei excepcional vigora enquanto permanecer situação anormal – cessada a situação que a determinou, é revogada. Nos dois casos, são autorrevogáveis, ou seja, sua revogação é automática. Mesmo que sejam autorrevogadas, continuam a ser aplicadas aos fatos ocorridos no período da sua vigência.
1.7. Retroatividade ou irretroatividade da Lei Penal mais benéfica?
Em virtude do prolongamento da consumação da conduta no tempo, aplica-se a lei penal nova mais severa nos crimes permanentes. Nos casos de crimes continuados, se os crimes foram praticados em sua vigência, aplica-se a lei penal nova mais severa. Atente-se à Súmula 711, do Supremo Tribunal Federal (STF): A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência. Se o agente continuar a reiterar as condutas, nos crimes habituais, aplica-se a lei penal nova mais severa. Com relação às medidas de segurança, se forem prejudiciais, não podem ser aplicadas.
2. Tempo do crime
Este estudo visa descobrir o momento da realização do crime, para resolver problemas relacionados à aplicação da lei penal, com a imputabilidade, a prescrição e a anistia, por exemplo.
2.1. Teorias da atividade, efeito (ou resultado) e mista (ou ubiquidade)
Segundo a teoria da atividade, o crime se realiza no momento da ação ou omissão. Pela teoria do efeito (ou resultado), o crime se realiza no momento do resultado. Segundo a teoria mista (ou ubiquidade), realiza-se o crime seja no momento da ação ou omissão ou do resultado. O Brasil, nos termos do artigo 4º, do Código Penal, adotou a teoria da atividade, por ser considerada a que mais se conecta à vontade do agente.
3. Contagem de prazos
O prazo penal conta-se da seguinte forma: inclui-se o dia do começo, independentemente da hora, ou se é domingo ou feriado, excluindo-se o dia do vencimento (artigo 10º, do Código Penal). Já o prazo processual penal, segundo o artigo 798, § 1º, do Código de Processo Penal exclui o dia do começo e inclui o dia do vencimento.
Se o Código Penal e o Código de Processo Penal versarem sobre a mesma matéria – como a decadência, por exemplo, artigos 103, do Código Penal, e 38 do Código de Processo Penal – a contagem que for mais favorável ao réu prevalecerá. No caso, o prazo penal.
O prazo penal, no seu decurso, tem como efeito a extinção do Direito de punir do Estado, pois tem como objetivo que tanto mais breve, mais favorável ao réu, não pode, inclusive, ser prorrogado para o primeiro dia útil subsequente. O decurso do prazo processual penal não acarreta na perda do Direito de punir do Estado, tendo sempre em mente, no objetivo da sua aplicação: quanto mais longo, melhor para o réu, podendo findar no primeiro dia subseqüente se não houver dia correspondente ao início do prazo (Súmula 310, do STF).
De acordo com a Lei 810/49, a contagem dos dias, meses e anos são feitas pelo calendário gregoriano (comum). Nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos, desprezam-se as horas no cômputo da pena.
4. Lei Penal no Espaço
4.1. Territorialialidade
Estuda-se o lugar em que incide a Lei Penal. No Brasil, vige o princípio da territorialidade temperada (artigo 5º, do Código Penal), ou seja, predominantemente a territorialidade é a regra, com algumas exceções.[2] Por princípio da territorialidade, entende-se que a Lei Penal de um Estado é aplicada aos crimes cometidos em seu território.
4.2. Extraterritorialidade incondicionada e condicionada
Em se tratando de extraterritorialidade, ou seja, aplicação da Lei Penal brasileira aos crimes ocorridos no exterior, há de se falar em extraterritorialidade incondicionada e incondicionada.
Como o próprio nome diz, na extraterritorialidade incondicionada não há condição. Mesmo que haja condenação ou absolvição no exterior, aplica-se a Lei Penal Brasileira. Se a pena da Lei Penal estrangeira for diferente da pena cominada na Lei Penal brasileira, atenua-se, aqui, a pena imposta pelo mesmo crime. Todavia, se pena é idêntica, computa-se a pena cumprida no exterior ao sê-la cumprida no Brasil.
Alguns casos de aplicação da extraterritorialidade incondicionada – princípio da proteção ou defesa real (considera a nacionalidade do bem jurídico lesado): crimes contra a vida do Presidente da República e crimes contra a liberdade do Presidente da República, crimes contra o patrimônio da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, Territórios, autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas, crimes contra a fé pública da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, Territórios, autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas, crimes contra a administração pública (por parte de quem estiver a seu serviço); princípio da justiça universal (criminoso julgado e punido onde cometeu o crime) – crime de genocídio em caso de agente brasileiro ou domiciliado aqui.
Já na extraterritorialidade condicionada, requer-se a entrada, no território nacional, do agente que cometeu o crime, que o fato – no país em que foi praticado – também seja punível, que o crime esteja no rol daqueles que a Lei Penal brasileira autoriza a extradição, que o agente não tenha sido absolvido ou cumprido pena no estrangeiro, que o agente não tenha sido perdoado ou tenha a sua punibilidade extinta, nos termos da Lei Penal (brasileira ou estrangeira) mais favorável.
Ainda com relação à extraterritorialidade condicionada, há mais outras condições se o crime for cometido por brasileiro no estrangeiro: não ter pedida sua extradição ou, se foi pedida, ter sido negada, requisição do ministro da Justiça.
Situações de aplicação da extraterritorialidade condicionada: princípio da justiça universal – crimes previstos em tratados ou convenções internacionais que o Brasil se obrigou a reprimir (artigo 7º, II, “a”, do Código Penal); princípio da nacionalidade passiva (Lei do Estado só é aplicada se o agente cometeu crime no exterior que ofenda bem jurídico no seu próprio Estado ou de um patrício, ou concidadão) – crimes praticados por estrangeiro fora do território brasileiro contra brasileiro; princípio da nacionalidade ativa (Lei é a do país do sujeito ativo) – crimes praticados por brasileiro; princípio da representação (Lei Penal deve ser aplicada aos crimes praticados em embarcações ou aeronaves brasileiras privadas quando em território estrangeiro e nele não forem julgados).
4.3. Território por extensão
As aeronaves e navios públicos ou privados são considerados, por extensão, território brasileiro. Aí, incidem algumas regras. Se o crime foi cometido em navio ou aeronave pública, aplica-se a lei do pavilhão ou da bandeira. Em se tratando de crime cometido em navio ou aeronave privada, aplica-se a lei local, se em mar territorial estrangeiro, ou a lei da bandeira, se estiver em alto-mar. Se o crime for cometido em barco-salva vidas ou nos destroços de um navio naufragado, aplica-se a lei da bandeira.
A competência para julgar crimes cometidos a bordo de navios de grande porte – e também contra a segurança do transporte marítimo – é da Justiça Federal. Porém, se for o crime cometido em embarcação de pequeno porte ou em área de fronteira, desde que não prejudique bens, serviços ou interesses da União – a competência é da Justiça Estadual.
5. Lugar do crime
Seu estudo serve para resolver problemas relativos a crimes à distância – conduta realizada num país e resultado, em outro. As teorias aplicáveis são: atividade – lugar do crime é onde ocorreu a ação ou omissão; efeito (ou resultado) – lugar do crime é onde se produziu ou se deveria produzir resultado; ubiquidade – onde houve ação ou omissão e onde se produziu ou se deveria produzir resultado é o lugar do crime (artigo 6º, do Código Penal), com a aplicação, na punição, do artigo 8º do Código Penal.
Há de se salientar, porém, que nos Juizados Especiais Criminais (Jecrim), vale a teoria da atividade. Nos casos de tentativa, o lugar do crime é o local onde foram praticados os atos de execução (ou executórios) ou onde deveria ter sido produzido o resultado.
6. Competência
Se a conduta for realizada no Brasil e o resultado, do crime consumado ou tentado, for no exterior, a competência é o do local do último ato executório no território nacional. Mas se a conduta for no exterior e o resultado, em crime consumado, for no Brasil, a competência é o do local do resultado. Entretanto, se a conduta for realizada no exterior e o resultado, em crime tentado, ocorrer no Brasil, a competência é o do local onde deveria ter ocorrido o resultado. E nos crimes plurilocais (conduta numa comarca e consumação em outra)? Segundo o artigo 70, do Código de Processo Penal (CPP), é o juízo da consumação do crime.
[1] Advogado, jornalista e professor universitário. Bacharel em Direito e Jornalismo, Graduado pelo Programa Especial de Formação de Professores de Filosofia, Pós-Graduado MBA em Comércio Exterior, Pós-Graduado Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal, Mestre em Filosofia (Ética). e-mail: ryabiku@adv.oabsp.org.br
[2] Exceções: extraterritorialidade – aplicação a Lei Penal brasileira a crimes ocorridos no exterior; intraterritorialidade – possibilidade de a Lei Penal estrangeira ser aplicada aos crimes cometidos no Brasil.
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