Há uma palavra em alemão denominada “Schadenfreude”. Talvez não exista uma expressão em português para traduzi-la fielmente. Numa tradução aproximada, significa “sentir-se feliz com a infelicidade alheia” (Schaden – dano; Freude – alegria). Quem não sentiu uma pontadinha de alegria, na Copa do Mundo de Futebol de 2010, quando a seleção da Argentina tomou uma goleada de 4 a zero da Alemanha? O mesmo ocorreu quando a Holanda ganhou por uma virada de 2 a 1 do Brasil.
Os olhares cínicos e as risadinhas amarelas no canto da boca, com suspiros de satisfação quando o outro se ferra, podem demonstrar a “Schadenfreude” com uma certa tipicidade. Quem sabe, tal sentimento reflita a verdadeira natureza humana, que se regojiza aos deleites diante da desgraça dos outros. Aliás, esse não é o segredo de sucesso das "pegadinhas" e outras "trapalhadas acidentais" veiculadas, principalmente, nos programas televisivos de domingo?
Sem as máscaras da moral cristã, se revelam os desejos destrutivos e o egoísmo extremado do ser humano. E também se dá vazão à hipocrisia. Quando se coloca uma pessoa no centro das atenções, todas suas ações e atitudes são analisadas como se vistas por um microscópio. Isto é, qualquer coisa – por mais normal que faça e que também a maioria das pessoas faz – é motivo de recriminação.
Neste caso, a “Schadenfreude” se dá pelo fato de o sujeito em questão ser descoberto e exposto ao público, enquanto os outros - que, provavelmente, fazem a mesma coisa - permanecem ocultos. Anseia-se destruir o outro quem sabe pelo fato de o mesmo lhe ser semelhante, no intuito de se tentar apagar aquela faceta interior que ninguém quer ver.
Afinal, ao se olhar no espelho nem sempre se gosta do reflexo, principalmente, quando mostra quem realmente se é. E ninguém aprecia ver sua imagem desnuda, com todas suas imperfeições. É melhor ver as imperfeições – mesmo as suas – nos outros.
Eis, pois, a “Schadenfreude”. O gozo em flagrar a corrupção alheia, já que a sua própria escapa impune. Corruptos e calhordas são os outros. É mais fácil viver assim: olhar a hipocrisia no outro, em vez de si mesmo, e clamar para que o outro tenha vergonha na cara, em vez de ter vergonha na cara por si mesmo.
Errados sempre são os outros. Dessa maneira, é bem melhor que olhar a si mesmo diante do espelho e morrer de decepção.
Publicado também no "Direto da Redação com Leila Cordeiro e Eliakim Araújo", URL: http://www.diretodaredacao.com/noticia/ser-feliz-e-gozar-com-a-desgraca-alheia
2 comentários:
Ja!
Pois é....facílimo ver os defeitos dos "outros",rs.
O que nos salva é a esperança de um mudança que sabemos merecer....mesmo arancando as máscaras da cara...com alguns pedaços grudados nela.
A cirurgia na própria pele é a mais difícil.
Belo texto,parabéns!
Lya Carvalho Jardim.
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